paishabilitar/ Dezembro 6, 2019/ Diário de Aveiro, Notícias, opinião inclusiva

After eighteen… ou a inaceitável leveza dos 18

Crónicas inclusivas: Uma parceria Pais Habilitar e Diário de Aveiro

After eighteen… podia ser uma nova marca de chocolate, um chocolate amargo, uma espécie de presente de aniversário mal escolhido.

É assim, António, tens 18 anos, por isso tens alta. Curado, resolvido? Não, mas sou pediatra e não sigo adultos. De certa forma, este teu aniversário até deixa mais leve a minha lista de pacientes.

É, sigo-te desde os quatro anos. Tens uma PHDA ou tens um Autismo, ou tens ambos. Estudámos juntos com uma lupa todos os teus sinais. Apostámos na relação com a escola, fui quase da tua família alargada, passeando pelas ruas um cartaz sobre articulação, intervenção por prioridades. Defendi a tua causa, insisti nas tuas capacidades, escondi avaliações psicológicas que te categorizavam num separador que eu sabia não ser o teu. Porque não cumprias nos tempos padrão, porque não realizavas quando saía dos teus interesses. Afirmei e reafirmei o teu potencial. Mediquei-te precocemente por saber que não controlavas o impulso e deixei que demonstrasses os teus poderes se organizasses a tua cabecita. E resultou. Foste um dos meus êxitos como pediatra do neurodesenvolvimento. Usei a tua escrita para ensinar terceiros, as diferenças da tua letra com e sem medicação; anotei o teu sucesso social quando a falta de autorregulação estava medicamente controlada e os teus colegas já te incluíam. Foste mesmo um exemplo.

Ainda assim, António, deixo hoje de te acompanhar. Sou pediatra, já te expliquei. Não vou participar do plano da tua vida quando afinal ela começa agora. Não opinarei sobre as tuas más decisões nem estarei para atender quando conduzires depois de beber, apenas porque nem pensaste, ou pensaste tarde demais. Nem me contarás dos múltiplos trabalhos que tentaste e não cumpriste, porque agiste por impulso ou nunca chegaste a horas.  

Espero que continues a ser seguido por alguém que não te julgue pelo teu discurso que parece pobre e desorganizado. Espero que não fiques por aí a voar sozinho, com as asas desencontradas. Espero que não te olhem como “pouco capaz”. Espero tudo isso… mas devolvo-te à tua família nesta fase em que tudo começa. Eu impotente. Tu sem perspetivas. A tua família a ver a repetição de um filme pesado, mas ainda mais só do que na primeira vez e sem poder legal para te impedir. Hoje, que tens 18 anos. Hoje, quando começas uma das mais importantes etapas da tua vida. Hoje, António, tenho consciência que te deixo lançar sozinho os dados, andar no trapézio sem rede. Hoje, António, tenho a consciência pesada.

Associação Pais e Amigos Habilitar

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